Romãs e castanhas


Na sua meninice, a Ana passava fins de semana de outono no Alentejo, na casa dos avós, - a "casa da terra"- que a esperavam sempre saudosos.
As chegadas eram sempre celebradas com abraços ternos e demorados e a sensação era a de que naqueles momentos a conseguiam envolver, por completo, em toda a sua pequenez.  
A miúda chegava e era tempo de a brindar com pequenos mimos.
O tempo frio convidava a pequenos almoços reconfortantes, com leite achocolatado e bolos caseiros, preparados propositadamente para a visitante.
E nos lanches não podiam faltar as esperadas castanhas assadas, estaladiças por fora e  cremosas no interior, que se desfaziam na boca, e lhe aqueciam o coração.


Damian Haas, food photographer

As romãs, que abundavam naquela época do ano, eram carinhosamente descascadas e colocadas à mesa na mais bonita taça.
Ela sempre gostou daquela explosão de sabores que resultava da mistura do gosto ácido das romãs, entrecortado pelo doce do açúcar, com que os reluzentes bagos vermelhos eram envoltos. 
Que bem lhe sabia,  ficar ali sentadinha, num pequeno banco de madeira, entre a avó Luísa e o avô Bernardo, a ouvir as histórias das gentes da aldeia, enquanto aquecia as mãos ao lume e ouvia o crepitar das primeiras castanhas.
Outras vezes, deixava-se estar na mesinha do quintal, à espera do pitéu, enquanto fazia, afincadamente os trabalhos da escola. Parece que ainda é capaz de sentir o cheiro doce das castanhas, o cheiro quente do lume.
Os serões passavam-se à braseira, com a família reunida. A Ana era ouvinte atenta das "conversas dos adultos" em que à medida que foi crescendo, ganhou direito a lugar.
Há um sabor misterioso no inverno e por isso esta é a estação do ano que elege.
Trocaria perfeitamente um dia de praia, com direito a mergulho, por um passeio a pé no campo a contemplar os tons que a natureza, nesta época, lhe oferece.
Como tem andado a organizar um magusto com uma "tropa de elite" lá no trabalho, estas memórias inundaram-lhe o pensamento.
Para dar vida a recordações que lhe são tão queridas, e em jeito de homenagem ao que já passou, a Ana delicia-se a cuidar dos preparativos, como se aqueles tempos distantes se fundissem com o momento presente.
Cada interveniente trará um manjar para degustação, a pretexto de haver acompanhamento para a castanhada, para além da natural pinguça, sempre presente.
Visualizou de imediato uma bola de carne, a sair de um forno de lenha, a fumegar, que adora. Não virá à mesa exatamente nestas condições, mas já coagiu a expert no assunto, a colega recatada e prendada do pedaço, a trazê-la.
Depois falou-se num presuntinho, pão com passas e azeitonas, um queijito, umas compotas, marmelada...
Pois que o mulherio organiza, vais às compras e cozinha e os colegas "machos" ajudarão...comendo!
E como a tropa é difícil de controlar no domínio da doçaria, parece que tem de haver bolo para finalizar.
Ela até se tinha lembrado de umas romãzitas, que ficam tão bem à mesa com umas castanhas, mas a coisa não colou.





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