À espera deles e da tarte de grão



Estou à espera nos sofás pretos que ficam ao fundo do café.

Já lí na diagonal todas as revistas espalhadas pelas mesas de apoio.

Descobri que se tratam vícios com terapias que implicam receber pancada em sessões, duas vezes por semana, descobri que a Cristina Ferreira é uma mulher muito caladinha e boa ouvinte quando está longe das luzes da ribalta e do Manuel Luís Goucha.

Já fiz conversa de circunstância com o dono do café e com o empregado simpático.

Já nos rimos juntos, já falámos na possibilidade de ir trabalhar para a cozinha como aprendiz de pasteleira em part-time. Aprendi que quando se apanha um cliente difícil, não há nada melhor que fazer um pequeno recolhimento, contar até dez, demoradamente, beber um copo de água e voltar a aparecer sorridente.

Já concluímos que não se pode levar a vida muito a peito e que vale sempre a pena mostrar a dentição, por mais cariados que tenhamos os dentes.

Já relaxei, já ouvi música boa, já pensei no que tenho para arrumar lá por casa,  já mandei mensagens a amigos que não vejo há algum tempo....

Já comecei a marcar a movida para o fim-de-semana.

É tão bom não ter nada para fazer e inventar ocupações.....

Por incrível que pareça, às vezes sabe bem secar à espera de alguém!

A voz doce da cantora que se ouve está a embalar-me. Estou quase a adormecer. Caramba, há vozes mesmo sexys. Ora aí está uma coisa que se pode treinar...como fazer uma vozinha sensual, rouca e arrastada.

Pronto, onde tu já andas! Vá, volta, foca-te, regressa ao habitat.

Um telemóvel toca na mesa ao lado, um casal de namorados, completamente enterrados nos sofás do lado põe a conversa em dia com uma amiga, entre muitas gargalhadas....o amor adolescente é lindo. Nem se percebe se estão a usar dois casacos ou se estão a partilhar o mesmo, tal não é a forma como estão agarrados. Um grupo de amigos passa o tempo, entre umas jolas e um tablet.

Lá dentro está uma tarte de grão a acabar de fazer, propositadamente para a pandilha por quem estou a esperar.

Vai uma fatia?

A atmosfera é tão descontraída que podia desejar só me mover em ambientes assim.

Tudo aqui está disposto por forma a que nos sintamos em casa e a sensação que se tem é a de estar num segundo lar. As tostas de pão saloio gigantesca, com presunto e queijo que servem ajuda a prolongar esta sensação, assim como o cheiro a chá espalhado pelo ar......

Eis que entra um grupo barulhento pelo café adentro!

É a minha malta.

Toca a guardar o bloco de notas. Agora é hora de socializar.

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