Memória de galinha



-Vai à Capoeira buscar ovos, vá gaiata.

- Tenho medo...

- Vai com o teu primo.

- Ó mãe, mas ele também tem medo.

- Ai estes gaiatos. Que mariquinhas. Querem ver que temos que ir lá os três!

- Tenho nojo das patas e medo que elas me piquem as pernas.

   Tem mesmo que ser?

- Vá, toca a marchar, à minha frente.

 O primo vai na liderança, para mostrar que é homem.

- Ai, não consigo. Eu fico aqui fora a olhar para elas.

- Olha para mim, dois ovos. Toma lá.
   Estás a ver tia? Não tenho medo nenhum.



E assim começa a convivência com as galinhas.

Antes devo ter convivido com elas em forma de canja.

Como não se podia transportá-las do campo para a cidade, pois as bichas não são dadas a apartamentos, toca de as fazer presentes na zona da casa que melhor representava o seu habitat....

Cozinha....
                                                               Terrina de estimação


- Mãe, parti a galinha!
- O quê? Partiste a galinha. Mas tu não tens tino?

Sim, a galinha ganhou importância para a família.

Então, como membro adoptivo, comecei a achar-lhe graça.

Entre as molduras com fotografias dos avós, dos amigos, das férias, da escola, lá estava ela.


                                                           Num quadro de ponto de cruz


                                            
                                                        Jurema, estrela de televisão.


A verdade é que ela me anda a acompanhar desde pequena.

Os pequenos recados, a lista de compras, bonecada, piadolas, passaram a constar numa ardósia adquirida, para a cozinha, em forma de galinha.


Nunca mais nos largámos.

- Isso já está na galinha?
- Aponta na galinha!
- Vai lá ver à galinha.

Se calhar é daí que vem a minha, muitas vezes, memória de galinha.


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