Tu e o teu estendal



- Olha aquela descarada do segundo andar, com o estendal cheio de cuecas de fio dental e de rendas vermelhas!
Mais valia que olhasse para o marido. Nem é capaz de lhe comprar uma sunga nova....

Os mais metódicos, mais resguardados e tradicionais aprumam-se na hora de passar a roupa, da máquina, para a corda.

As meias são penduradas sempre na companhia uma da outra, os lençóis e as peças mais amplas ocupam a primeira linha, as cuecas, soutiens e tudo o que é de mais íntimo, salta para a fila de trás.

As molas são colocadas à mesma distância umas das outras e não se usam diferentes qualidades.

A roupa de cor é estendida em dias diferentes da roupa branca, para não manchar.

No verão é tudo virado do avesso.

Já os mais espontâneos, os menos comedidos exibem a  sunga, o triquini, a cueca de asa delta, a meia rota do filho, como exibem a toalha de mesa, a toalha de praia e outras tantas coisas do lar. Se for possível falar ao telemóvel ou fumar um cigarrinho em simultâneo, tanto melhor.  No estendal, assim como na vida, não há lugar a pudores. Roupa é roupa. O melhor é despachar. E se o vizinho cuscar, ainda melhor...coitadinho, precisava mesmo de alguma coisa para falar!

- Desde que se mudou para o condomínio já ganhou mais decoro, a desavergonhada. Ficou fina. Agora quase que estende dentro de casa.

- Ao menos já não lhe vêem as nódoas e a roupa rota, como "a gente" via.

- Anda, deixa-a andar. Mais tarde ou mais cedo o verniz há-de estalar.


                                             NÃO MEXAS NO MEU ESTENDAL










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