Saudosismos




Antes de saires porta fora com o material para fazer lume, deixas-me sempre a ouvir esta mulher.

Mal sabes tu que à segunda música já me correm as lágrimas pela cara. Mas descansa, são lágrimas boas.

Nesta quase hora de domingo, em que te escuto, ajudas-me a sarar grande parte das minhas mágoas.

Enquanto a miúda acaba de fazer a cama e eu limpo o pó à casa, arrumo a loiça nos armários, escuto este concerto intimista com que me brindaste.

Aproveito para sentir saudades do que já foi, de quem já não tenho, do que perdi, porque amanhã, amanhã já não tenho tempo. Às nove horas já estou sentada à secretária, tu já vais a caminho da reunião com os espanhóis e a catraia treme perante o teste de matemática.

Entrego-me a uma dor, quase reconfortante, quase doce, parva até, para onde estas palavras cantadas me encaminham.

Encostada à bancada da cozinha, perdida entre o passado, o presente e o futuro, preparo o que falta do almoço.


                                    

Envergonho-me de te ter, já adolescente, na divisão ao lado e querer ter-te pequena, outra vez, a caminho da escola, pela minha mão....e sinto saudades!

Simultaneamente desejo ardentemente viver convosco aquilo que ainda está por vir e alegro-me, enquanto o fado ainda toca, por saber que te vou ver mulher e mesmo assim já sentir.....saudades!

- Mãe, estás a chorar?

- Que tonta filha! Não vês que estou a cortar cebola. É só isso. Mas já agora, dá cá um abraçinho.

- Tenho que te por a ouvir outra coisa, sem ser Amália Rodrigues. Já ouviste Shina? Podiamos alternar os fadunchos cá por casa, não achas? Era mais que justo.

- Era bom era. Vai lá dizer isso ao teu pai.

Descoberta de uma linda voz de fadista, na Fnac!


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